Suplementos vitamínicos e reposição de cálcio: o quanto o abuso durante a pandemia de Covid-19 pode afetar seu rim?
A pandemia de Covid-19 mudou os hábitos de consumo das pessoas e essa alteração foi notada também na ingestão de medicamentos. O uso de suplementos vitamínicos para o reforço do sistema imunológico cresceu 29% em 2020. As pessoas se preocuparam mais com alimentação e dieta, mas aumentaram exponencialmente a automedicação e suplementações de vitaminas desnecessárias, trazendo riscos para a saúde dos rins.
A pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2) pode ter contribuído para a população brasileira usar mais suplementos alimentares e vitamínicos. Ao menos é o que sugere um levantamento encomendado pela Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres (Abiad). Foram realizadas 275 entrevistas no mês de maio 2020 em várias cidades do Brasil. Em todo os lares avaliados pelo menos um morador recorria aos suplementos. O estudo indica que 48% desses usuários passaram a ingerir mais multivitamínicos e afins. Outros 47% mantiveram a mesma taxa de consumo, enquanto apenas 5% diminuíram o uso desses medicamentos.
A maior justificativa para o aumento da busca desse tipo de medicamentos no período avaliado foi melhorar a imunidade (63%), sendo que 9% dos indivíduos mencionaram especificamente a Covid-19. Os três tipos mais procurados foram multivitamínicos (28%), vitamina C (26%) e vitamina D (8%).
Mas é importante ter cautela. Não existe evidência de que suplementos reduzam o risco de infecção pelo novo coronavírus. Em um documento que aborda diferentes tratamentos contra essa infecção, a Sociedade Brasileira de Infectologia descreve que não há comprovação de benefício no uso de vitaminas C ou D, nem de suplementos alimentares como zinco, por exemplo, exceto em pacientes que apresentam hipovitaminose ou carência mineral.
Os suplementos alimentares têm por principal função complementar a dieta, seja para a reposição nutricional, seja para fins específicos – como ganho de massa muscular –, fornecendo os nutrientes necessários para o funcionamento saudável do organismo como, por exemplo, proteínas, carboidratos, vitaminas ou minerais. Porém, se consumidos de forma inadequada, em vez de nutrir, eles podem prejudicar nosso organismo, especialmente os rins e o fígado. Podem também desencadear uma série de problemas leves e graves à saúde, uma vez que o excesso em alguns casos ocasiona uma sobrecarga desses órgãos e/ou o acúmulo de substâncias. Entre essas complicações temos:
• Cálculos renais: normalmente causados pelo uso excessivo de suplementos hidrossolúveis como os minerais, especialmente o cálcio, fosfato e vitamina D.
• Intoxicações: muitas pessoas tomam exageradamente suplementos vitamínicos acreditando que o excesso será totalmente eliminado pelo organismo. É verdade que, ao contrário de proteínas e carboidratos, as vitaminas são eliminadas, mas o excedente de uma vitamina pode ocasionar a necessidade de consumo de outra e esse desequilíbrio leva a uma intoxicação renal. As intoxicações pioram o funcionamento dos rins e podem provocar insuficiência renal.
• Insuficiência renal: causada principalmente pela ingestão excessiva de suplementos proteicos, que obriga os rins a trabalharem mais, levando a um quadro de insuficiência parcial e até mesmo total, a longo prazo.
É importante saber porque consumir vitamina D em excesso é prejudicial. A dosagem da suplementação de vitamina D deve ser personalizada e dependerá dos resultados de exames que comprovam haver essa necessidade. A ingestão de doses elevadas de vitamina D por longo período pode ser tóxicas e levar à hipercalcemia ou hipercalciúria (níveis altos de cálcio no sangue e na urina, respectivamente). Este efeito colateral pode causar lesões nos rins e danos em ossos e músculos. O consumo excessivo de cálcio também pode ocasionar cálculos e calcificação ectópica nos rins (nefrocalcinose).
Para evitar que os rins funcionem em sobrecarga deve-se manter uma dieta com nutrientes balanceados, sem excessos, e tomar água em quantidade adequada. O consumo de água é ainda mais importante se a pessoa faz uso de suplementos alimentares e pratica atividade física. O uso de suplementos está muito além da leitura do rótulo. Para se ter um consumo saudável a escolha e dosagem do suplemento precisa ser ajustada à condição física de cada pessoa e, por isso, ser feita sempre acompanhada de um nutricionista e um médico.
*Irina Antunes (CRM 75.350 SP) é nefrologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo e da Santa Casa de Medicina de São Paulo, com residência e doutorado em Nefrologia pela Universidade de São Paulo (USP).